..::Geléia de Pérolas::..

20.9.03


Joaquim

Ninguém me perguntou, mas vou contar assim mesmo. O curso de crônicas na Estação das Letras vai bem, obrigado. São 11 alunos - nada mal, levando-se em conta que as aulas vão das 15h às 17h. Logo de cara, um deles quis saber: "Professor, o procrastinador pode ser um escritor?". Procrastinador? Quem me salvou foi Paulo Mendes Campos. Há tempos, tinha lido sua crônica "Brasileiro, homem do amanhã", onde ele diz que as duas colunas da brasilidade são a capacidade de dar um jeito e a a capacidade de adiar, ou seja, de procrastinar. Nunca mais esqueci da palavra. "Para o brasileiro, os atos fundamentais da existência são: nascimento, reprodução, procrastinação e morte (esta última, se possível, também adiada)", escreveu o cronista. E, assim, pude responder com toda segurança: "Sim", e explicar porque o procrastinador pode ser um escritor. É uma turma interessada e atenta. Hoje levei a tiracolo o Joaquim Ferreira dos Santos, para dar uma palestra. Joaquim fez todas as gracinhas possíveis: leu crônicas, contou casos, falou com graça do penoso ofício de passar a vida colando palavrinhas uma atrás da outra. Duro agora é voltar a dar aula depois do show de Joaquim.

MAURO VENTURA, 7:44 PM


19.9.03



Eu quero sossego

"Vamos aceitar que a governadora não queira abrir mão de sua autoridade e da soberania de seu mandato. Respeitemos sua altivez e valentia. No Rio manda ela, e para isso foi eleita. Agora, ponha-se no lugar de quem quer ajudar: você aceitaria dar grana, pessoal, armamento, know-how, sem ter o controle de como esse investimento será usado?

Como confiar na eficácia de um esquema policial que não consegue
sequer impedir a entrada de celulares e armas no chamado presídio de segurança máxima de Bangu?

O problema nessa história de suscetibilidades à flor da pele é que não
se consegue acreditar no que Rosinha prometeu. Será que alguém
acreditou? Não se sabe o que é pior, se a sua soberba ao afirmar que
pode conter sozinha a violência no Rio, ou se a ingenuidade de
recorrer ao exemplo do marido, cujo governo, ela afirma, fez baixar os índices de criminalidade.

Não é nem o caso de discutir a afirmação. Basta lembrar-lhe que, no Rio, há muito tempo foram quebrados os termômetros. Não se precisa de instrumento para medir a febre. Não é como o calor, que a gente acompanha pelos relógios digitais. A violência não se mede com números e nem se combate com palavras.

O que adianta esse surto de "eu prendo e arrebento" se, enquanto ela se reunia no Palácio Laranjeiras para recusar a ajuda do governo federal, perto dali um professor era assassinado na porta de sua casa, às 7 horas da noite, quando saía para passear com o cachorro? Ou se, na Via Dutra, um arrastão aterrorizava os motoristas roubando carros?

Ou se...

Os casos são infindáveis. Será que a governadora não lê a seção de cartas do GLOBO? Na segunda-feira, todas as 14 mensagens publicadas eram sobre a violência. Ontem, eram vinte. Mais do que e-mails ou cartas, eram gritos de aflição, desespero, dor, protesto, revolta.

Essas pessoas não estão interessadas em discutir se a tranqüilidade é
federal, estadual ou municipal, como já se fez com o mosquito da dengue.

Nossos dirigentes adoram esses debates. Mas agora chega de bate-boca entre autoridades, de arroubos, de valentia, basta de ameaças. Como cantava Tim Maia, eu quero sossego, qualquer que seja sua procedência, venha de onde vier. De Lula, Rosinha ou Cesar Maia, de preferência dos três juntos, se isso for possível".

ZUENIR VENTURA


14.9.03


Ninguém entendia muito bem como aquele mulherão estava com o Brito. Uma mulher que esbanjava charme, linda e, ainda por cima, simpática e inteligente. Tão maravilhosa que mesmo as mulheres mais ciumentas dos amigos do Brito não conseguiam ter ciúmes ou raiva dela. Afinal, ela era legal demais. E extremamente fiel ao Brito.

Mas o que ela tinha visto no Brito? O Brito era feio, pobre, pouco asseado, careca, tinha um físico de orca e ainda por cima era meio chato. Vivia dando furos, inconveniente, já tinha conseguido separar dois casais da turma só na base da gafe. Além de tudo era meio burro e falava palavrões demais. Tudo bem, era um cara legal e bonzinho, e às vezes até conseguia ser simpático, mas isso não justificava a paixão que a Cicinha tinha por ele.

As meninas viviam perguntando pra Cicinha o que ela tinha visto nele. E ela simplesmente suspirava e falava que era paixão. Ô paixão braba, sô! Dizem que o amor é cego, mas aquilo era uma verdadeira obturação ocular!

Só que um dia, ao chegar em casa depois de fazer as compras (o Brito nunca ia e sequer ajudava ela a descarregar, tinha preguiça), ela encontrou o Brito a traindo com a Feiticeira. Pior, do lado ainda aguardavam a sua vez a Tiazinha, a Babi, a Vera Fischer e até mesmo a Maitê Proença, meio amassada, com pagina faltnado... ele nem tentou explicar, veio na direção dela com a cara mais deslavada do mundo pra dar um beijinho de boas vindas e ela, horrorizada, deu-lhe um belo chute no Britinho.Saiu de casa chorando e dias depois, a sua irmã foi buscar suas coisas e deixou um bilhete no qual se lia, entre borrões e marcas de lágrimas, que queria o divórcio.

Todo mundo esperava que o Brito fosse ficar inconsolável, mas ele, pelo contrário, seguiu sua vida normalmente. Nem parecia que tinha perdido aquela mulher maravilhosa, ia trabalhar tranquilo, falava no assunto como se estivesse comentando um jogo de futebol e tinha até melhorado o visual. Perdeu uns quilinhos, agora tomava banho todo dia e tinha até melhorado o humor. E a Cicinha, que tinha se livrado daquele peso, até vestira luto. Alias, ficava linda de preto. Mas nenhum homem podia chegar perto dela, ela não queria saber de nada disso. Ela dizia que era como se tivesse enviuvado, e que o Brito era o homem da vida dela.

Ninguém entendia nada. O Brito passou a sair toda noite e sempre voltava com uma mocréia pra casa. Uma pior que a outra. A última parecia uma colisão de trens de carga de país subdesenvolvido. O Rubão chegava a falar (em off, a mulher dele que não o escutasse) que se tivesse tido uma mulher como a Cicinha, ia broxar com qualquer outra que aparecesse na sua frente. Ainda mais aquele jiló em forma de gente.

Um dia desses, Brito morreu, de repente. Um espanto. O Brito era mesmo surpreendente! Agora que parecia estar remoçado, em melhor forma do que nunca, ia morrer assim? A Cicinha quase teve um troço quando soube. No enterro, ela queria ir junto, chegou a se jogar na vala e não havia cristo que a tirasse de lá! Era impressionante, nem a mãe do Brito entendia essa... coisa!

Depois de algum tempo, descobriram uma carta, esquecida naquela bagunça que era a casa do Brito. Era do Brito, pra quem quisesse ler. E era fantástica.

O Brito já sabia que ia morrer e não tinha contado pra ninguém. E amava tanto a Cicinha que preferiu fazer com que ela o deixasse e morresse de raiva dele do que iver os últimos dias de vida com ela. Por isso saia com as barangas mais barangas do mundo. Por isso que se fingiu de safado, de sacana, de um verdadeiro cafajeste.

No fundo, era a única explicação lógica pro amor da Cicinha por ele. Afinal, ele era o único que a tinha amado de verdade, como se deve amar alguém, e não a idolatrando como uma coletânea de qualidades.

13.9.03

Nishi às 7:42 PM


7.9.03

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