Na rua, meio dia, saindo de casa com uma outra garota chata a tiracolo.
Na calçada, mais adiante, detecto-os pela silhueta. Caídos no chão, uniforme da mecânica, marmitas abertas, até a sombra deles fala alto e emite perdigotos. Estão todos no aguardo que um par de pernas depiladas passe, para desfiar um rosário de grosserias dignas da escória mais escória das escórias, a que o alvo deve ouvir de cabeça baixa.
À frente, os outros atravancam a passagem com suas barrigas protuberantes, calos sexuais sinalizando prosperidade (leia-se dinheiro para comer quem naturalmente não lhes daria). Berram no celular, chacoalham relógios grandes, sentam no carro e emitem "porras" e "caralhos" com a sutileza de quem vomita. Testosterona enche o tanque dos importados.
Depois as pessoas não entendem porque eu atravesso a rua, passo no meio dos carros, mas nunca - NUNCA - no meio deles.
Se não tenho saco pra aturar gente, terei menos ainda para sub-categorias.
"Someday... when I'm awfully low... when the world is cold...." Não é simplesmente odioso como quando temos rompantes apaixonados, podemos, dentre várias coisas, arruinar aquelas músicas mais perfeitas... aquelas músicas que havíamos escolhido para dançar/ouvir somente com o único homem no planeta que seria capaz de compreendê-la e fazê-la feliz?
Aquele cara... aquele mesmo que além de bonito e inteligente, é um tremendo pé-de-valsa. Dança como ninguém e você só precisa se deixar levar pelas mãos dele.
Hmmm... era assim pra mim quando eu ouvia "The Way You Look Tonight". É. Com o Tony Bennet. He!
Aí, um belo dia... num belo dia de afobamento eu disse pra mim mesma: "este é o homem". E entreguei essa música pra ele. Ele não me puxou pra dançar com ela e só fez pior no final.... E o pior de tudo é que eu gastei outras músicas "fabulosas" com ele. E com mais outros homens inomináveis. E pior ainda: eu não consigo mais escutá-las como antes sem lembrar deles. Não aquele tipo de lembrança dor-de-cotovelo... mas a lembrança de eu ter desperdiçado a coisa certa com a pessoa errada.
ugh!
Existe lavanderia pra músicas? Exorcismos?
Eu desisto. Os únicos homens que serão autorizados a ficar na minha cabeça toda vez em que eu pensar nisso são o meu pai (porque ele dançava comigo quando era pequena) e o homem-sem-face (aquele mesmo, que habita a imaginação de todas as mulheres...)
Esse post vai ser meio sem sentido para algumas pessoas. Para outras (as que me conhecem bem), vai ser bem realista. E para uma pessoa em especial talvez sirva como ponto de partida para algo novo, assustador e muito, muito bom.
Desci do ônibus e vi um cachorro. Uma cadela, na verdade. Uma mistura de Benji com um gremlin. Era um animalzinho feio, feio, feio, mas com olhos tão doces que me comoveram de forma absurda. Me aproximei daquela coisinha, estendi a mão e a cachorrinha correu, assustada. Tentei novamente e ela venceu aquele medo todo, provavelmente adquirido às custas de pontapés e outras crueldades, apenas para receber um afago na cabeça.
Não havia comida e ela tinha fome. Sabe-se lá há quantos dias não comia nada e só esperava pela caridade de alguém, por um pedaço de pão, por um pratinho de sobras de comida. Quando percebeu minhas mãos vazias, se afastou e foi procurar outra pessoa que pudesse alimentá-la. Não encontrou e voltou para mim, com aqueles olhos imensos a me torturar. Vim embora sofrendo por ela, pela descrença dela nos humanos, pela fome dela, pela solidão.
E me senti um pouco como ela quando pensei no quanto nos machucamos e no quanto temos medo de confiar novamente em pessoas, porque as pessoas machucam, porque as pessoas podem ser cruéis, porque a fome não é só de comida. Às vezes um carinho basta.
É preciso aprender a vencer esse medo, a correr riscos e a viver cada uma das situações, porque mesmo que demore, sempre vai aparecer a mão para nos afagar e alimentar. Bloquear a vida por receio de ser mais uma vez machucado não traz nenhum tipo de consolo. Vale a pena, sempre vale a pena tentar de novo.
Odeio filas. Principalmente quando tô sem walkman. Odeio gente que fica conversando em filas como se estivesse no botequim da esquina. Odeio mais ainda quando quando tentam puxar assunto comigo ou então quando fazem algum comentário como num monólogo e olham pra gente a procura de aprovação pelo que disseram. Adoro o meu walkman e hoje mais do que nunca senti sua falta. Logo a minha frente (como não poderia deixar de ser) um trio conversava a respeito de filhos -mal se "conheceram", já abriram a vida pra loja inteira. Juro que procurei abstrair, mas em dado momento foi impossível (me senti a próprioa versão feminina de Woody Allen em "Noivo neurótico, noiva nervosa" na cena da fila do cinema). Uma senhora falava a respeito do filho: "Anos 70 era fogo! Havia muita droga, tudo era novidade. Meu filho começou a usar drogas aos 15 -dos 15 aos 20. E Morreu. Graças a Deus!". Detalhe: a coroa RIA!!! E o pior: os outros dois ainda tentaram aprofundar o assunto como se fosse a coisa mais legal do mundo!! Definitivamente: andar sem walkman ou livro ou revista ou qualquer outra coisa que desvie a atenção é prejudicial à saúde; SER só é prejudicial à saúde dos outros.
mas falando melancolicamente agora.....
eu não sei pq, eu não sei como, eu consigo eliminar pessoas da minha vida sem dó, enquanto outras eu fico sofrendo, triste, com saudade. Vai entender. Eu não tô falando de ninguém especificamente, e sim muito genericamente. O menino daqui do escritório, p. ex... eu não dou bom dia pra ele há uns 3 meses, e nem assim eu fico chateada. Me colocaram num cliente ( ainda bem que minúsculo ) junto com ele, eu deveria ter dado um piti, mas não. Nem liguei. Até ri das piadinhas que fizeram a respeito disso. Eu não o agrido, não o trato bem. É simplesmente indiferente. E eu que achei que a minha vida ia ser um inferno por causa disso. Que nada.
Já o contrário também acontece. Pessoas que eu não tive nem um décimo do contato que eu tive com ele, pessoas que tiveram muito mais contato comigo que ele, pessoas que não sabem nada da minha vida, pessoas que nunca nem sentiram o meu cheiro ou olharam na minha cara - sim, estou incluindo neste "pacote" alguns dos meus pseudo-amigos de internet ( graças a deus eu tenho grandes e bons amigos de internet ) , me fazem uma falta tremenda. Às vezes nem é saudade. É só a tristeza de não ter conseguido resolver as coisas do jeito que deveriam ter sido resolvidas, ou ainda a decepção por ter acreditado numa coisa, quando na verdade era tudo tão diferente.
No final das contas, tudo dá certo. Mas me impressiona mesmo como algumas pessoas que a gente julga tão importantes na nossa vida simplesmente não fazem diferença quando somem, e outras deixam um buraco enorme dentro do nosso coração.
ok, winnie. back to reality, stupid.
O mundo queima.
Frio. A chuva castiga o asfalto.
Uma ordem de despejo em meu nome.
É estranho não ter para onde ir.
Queimo em silêncio, como meu último cigarro.
Meus olhos estão secos. Minha garganta está fechada.
Nada vai me fazer parar. Vou até o fim no que escolhi.
Minha vida é só o rascunho. Fica tão mais bonito no papel.
Cena 3: Fim do jogo entre Brasil e Turquia. Fora do estádio, o colunista aguardava sozinho o resto da equipe terminar suas tarefas. Admirava a paisagem de Ulsan sentado num banquinho, cercado por um canteiro de flores. Na Coréia, é assim: você se descuida e fica cercado por um canteiro de flores. Uma família se aproximou. O pai e a mãe, lá pelos seus 30 anos, a sogra de um deles e o bebê, de 1 ano e pouco. Achei que eles iam simplesmente passar por mim. Mas parece que me olhavam. E falavam alguma coisa. Rindo. Sem parar. Cada vez mais perto. Aquilo só podia ser comigo. A mãe pega a criança pela mão, chega mais perto. O pai e a sogra se afastam. Mas o que é isso? A mãe bota o filho no meu colo! Será que vão fugir e me deixar com esta responsabilidade? Logo eu, que já tenho quatro cachorros? O pai, de longe, prepara-se para tirar uma fotografia. A criança não gosta do meu colo e ameaça sair. Ah, não. Se esse pirralho estragar a foto é capaz de a família começar tudo de novo. É agora ou nunca. Agarro a criança pelas fraldas, encaro o pai e digo “cheess”. Um flash desfaz a cena. A família retoma a criança e se retira às gargalhadas. Se não sou o tipo ocidental mais exótico que já pisou na Coréia, minha imagem deve estar ilustrando um site pornô coreano especializado em pedofilia.
Numa mesa de bar, um grupo de pessoas conversa euforicamente. Todos falam alto e ao mesmo tempo.
- É impressionante. Interessante, original, denso...
- Muito bom e direto!
- Tenho orgulho de saber que existem pessoas como ele representando a nossa geração.
- E o texto é criativo, fluído, inteligente...
- Eu me identifico totalmente!
- Alguns diálogos tiveram um efeito bombástico em mim.
- É. Eu passei mal. Ainda não consegui forcas para ler tudo. Foi um choque ler palavras como as minhas em situações que poderia ter vivido há uma semana - só que nos textos de outra pessoa.
- Eu nunca vi algo tão profundo e tão escroto ao mesmo tempo, mas é muito maneiro. O cara é melhor poeta vulgar que eu já vi.
- É como um Dalton Trevisan, só que mais urbano... Mais psicodélico...
- Eu queria ter a coragem de escrever assim.
- Parece que Bukowski vive e mora no Rio de Janeiro.
- Acho que os textos demonstram claramente quais são as obsessões sexuais dele...
- Homens, mulheres, sexo solitário, desencontro, solidão, algum rancor, o cotidiano...
- Mas ele deveria escrever mais.
- Concordo. Atualiza muito pouco a página...
- Eu sempre vou e não tem nada de novo. Já li tudo.
- Já enchi o saco do cara... Mas ele é meio estranho.
- Duas caras... Ambíguo demais. Muito subtexto. Não tenho saco pra ele.
- Tem gente que só é boa escrevendo.
- É.
-Não sei se vou pro forró na feira de São Cristovão, pra rave ou pra ópera do Municipal
-Eu não sou lésbica. Eu curto homens também. Sou bi.
-Não sei se faço medicina ou jornalismo. O que mais tem a ver comigo?
-Ai, eu adoro Machado de Assis e já li todos os livros do Alan Kardec e do Paulo Coelho
-Pô, qualquer parada tá valendo
-Eu posso até cheirar, mas me preocupo com minha saúde. Eu malho e tal
-Ai, eu adoro natureza, literatura, futebol, cinema, cidade grande, gato e cachorro
-Eu curto tudo: Britney Spears, música clássica e Radiohead
Todo mundo é eclético ou é falta de personalidade mesmo?
(Um casal passeia por uma rua barulhenta de São Paulo)
- Pra você, o que faz o mundo girar?
- Você.
- Não, sério. O que faz o mundo girar? No sentido geral, para todas as pessoas?
- Como assim?
- O que faz o mundo girar? O que motiva as pessoas a levantarem da cama todo dia? O que motiva as coisas a acontecerem?
- Não sei. Por que você pergunta?
- Porque eu descobri a resposta. A minha resposta, pelo menos.
- Não dizem que é o amor? O amor faz o mundo girar.
- Muito clichê. Não concordo. Tem muita gente que não tem amor e continua vivendo.
- Dinheiro, então? Não... Você não é do tipo que responderia "dinheiro" a essa pergunta.
- Não, não. Pelo mesmo motivo: tem muita gente que não tem um puto no bolso e continua tocando a vida.
- Então o que é? Deixa de suspense.
- As pessoas continuam vivendo por causa daquelas famosas duas palavrinhas...
- Hmmmmm... "Te amo"?
- Não. (Pausa) "What if?".
- "What if"?
- É. What if…? E se...? As pessoas vivem de expectativa. As pessoas vivem para tentar responder a essa questão.
- Não acho.
- Não, você não entendeu. A essência da existência humana é a constante mudança. As pessoas vivem para descobrir o que vai acontecer. Ou vivem da esperança de algo que nunca vai rolar. E se um dia eu ganhar na sena? E se eu conseguisse o emprego que eu sempre quis? E se eu arranjasse um amante? E se...?
- Parece filosofia de botequim.
- É por isso que o mundo continua girando mesmo para pessoas que não têm amor ou que não têm dinheiro. Elas ainda têm esperança de que um dia vão conseguir amor, ou dinheiro, ou seja lá o que quiserem. Elas ainda têm esperança de serem felizes.
- A esperança faz o mundo girar, então?
- Acho que eu não diria "esperança" em si. Não no sentido pueril, bobo, que a palavra tem. Prefiro "expectativa". Ou "possibilidade". As pessoas vivem de possibilidade.
- As pessoas vivem porque é possível.
- Pensa um pouco: não tem nada mais desolador do que um homem sem esperança. As visões que mais nos comovem são aquelas de pessoas totalmente destituídas da fé na mudança. Ou da possibilidade de mudança.
- Estou pensando nas fotos dos judeus nos campos de concentração.
- Exatamente. Não é vê-los pelados ou magricelas que nos toca. Talvez a gente não perceba, mas é ver uma pessoa totalmente descrente na mudança que nos choca tanto. É como que alguém sem espírito. (Pausa). A mesma coisa com os mendigos. Ou com as crianças de rua. A gente sente pena porque sabe que a possibilidade de mudança para elas não existe, é mínima. Pode haver mudanças pequenas, cotidianas, mas nenhuma grande o suficiente como a que a gente quer para elas. Uma melhoria de vida. Sair da miséria.
- Para elas, então, o mundo parou?
- Para elas não. Elas ainda têm esperança de mudar de vida. A gente é que não tem esperança por elas. Elas ainda continuam tocando a vida, sei lá, na esperança de hoje conseguir juntar um dinheirinho pro almoço. Ou de encontrar fulano de tal. É como eu disse, esperanças cotidianas.
- Entendi. "A esperança é a última que morre".
- É brega mas é verdade. Olha só: você já se perguntou por que as pessoas cometem suicídio? Tem muita gente que se mata que tem dinheiro, que tem o amor da família, dos amigos. Tem de tudo. Mas não tem esperança. Falta o "What if?". Todo suicida é um desesperado, no sentido literal da palavra. As pessoas podem até gostar dele, mas ele encana que nunca ninguém o amou, nem vai amar, e pronto. Vai lá e se mata.
- "Adeus mundo cruel".
- Adeus mundo cruel. Mundo cruel que parou de girar.
(O casal caminha um tempo em silêncio)
- E se a gente pegasse um cineminha?
- Beleza.