Quando Eu Ficar Velhinho Quero Ser Roadie do Meu Filho
Às vezes eu penso que já é hora de ter um filho. Um japinha de cabelos espetados com o corpo cheio de dobrinhas correndo pela minha casa. Ou uma pequeninha oriental que mais parece uma boneca de porcelana. Sim, estou ficando velho, cada vez mais próximo dos trinta anos e meu instinto paterno começa a bater mais forte.
E então eu penso no rock'n'roll. Sei que posso parecer um louco, mas não há como separar a idéia de ter um filho do rock'n'roll. Minha vida toda foi definida pelos discos que ouvi. E quando eu for pai não será diferente.
A mãe provavelmente não vai gostar, mas eu irei fazer de tudo para que a criança tenha um nome rock'n'roll. Se for menino, penso em Lennon ou Dylan. E para menina, quero Ronnie, Dusty ou Nico. Sonho também em deitar sobre a barriga da futura mãe e, com um fone de ouvido, fazer o bebê ouvir minhas canções prediletas. Iria montar uma seleção em ordem cronológica: começo com Elvis, depois muito soul e pop dos 60, mudo para Beatles, Beach Boys e Velvet Underground, vou para a new wave e punk dos 70, faço uma intensiva de rock inglês dos anos 80 (com ênfase, claro, no Echo & The Bunnymen), passo pelos Pixies e pela cena de Seattle até terminar nos britânicos do Teenage Fanclub, Radiohead e Travis. Para o parto, já escolhi até a trilha-sonora. É "In My Life", a minha predileta dos Beatles. E de madrugada, quando ele acordar, vou cantar "Be My Baby" e vê-lo dormir em meus braços.
Meu filho vai crescer assim: em meio a discos e as histórias que cada um deles me trazem à memória. Talvez ele se revolte e deteste a música que seu pai adora. Talvez ele morra de vergonha cada vez que seu pai diga que vai ser o DJ da sua festa de quatorze anos. Talvez ele resolva, por birra, torcer para o Internacional e virar sambista. Mas quer saber? Eu não me importo em correr este risco. Até porque a paixão pelo rock'n'roll é a maior herança que posso deixar. E, você sabe, um Takeda sem paixão não é um Takeda.
no começo do blogpop (quando ele ainda era do blogger) eu escrevi sobre o filme "antes do amanhecer" e acabei recebendo alguns e-mails de apaixonados sobre o filme. esqueci de comentar sobre um dos momentos mais verdadeiros e delicados do filme.
os dois personagens, interpretados por julie delpy e ethan hawke, estão em uma loja de discos em viena. eles ainda não se conhecem direito e estão naquela fase de curiosidade e atração. a meiga francesinha interpretada por julie delpy escolhe um vinil para ouvirem numa das várias cabines da loja. o disco é da cantora folk americana kath bloom.
nesse momento que acontece a mágica. come here, bela e simples canção, começa a tocar e os nossos protagonistas ficam calados. muito se fala sobre os mais românticos ou mais sexys beijos da história do cinema, entretanto ninguém fala daquele momento que antecede o beijo. a troca de olhares tímidos, o silêncio desconfortável, o suor e o coração batendo. e isso que é retratado fielmente nesse belo momento. toda a tensão que qualquer um já experimentou. richard linklater deixa os atores liderarem o clima dessa cena. você fica nervoso junto com eles.
principalmente quando o beijo não chega. é um dos anticlímax mais belos do cinema.
come here
(kath bloom)
There's a wind that blows in from the north
And it says that lovin' takes its course
Come here
Come here
No I'm not impossible to touch
I have never wanted you so much
Come here
Come here
Have I never laid down by your side
Baby let's forget about this pride
Come here
Come here
Well I'm in no hurry
You don't have to run away this time
I know that you're timid
But it's gonna be all right this time
There's a wind that blows in from the north
And it says that lovin' takes its course
Come here
Come here
Please...
Hey hey...
Hey hey...
13.Out.2002 | O Brasil mudou muito, e isso não é o início de um comentário sobre o país que saiu das urnas de seis de outubro. Ouçam, por exemplo, o barulho que vem das seis horas. Foi-se o tempo, e não foi há tanto assim, em que o Brasil parava às seis horas ao redor do rádio para fazer a oração da Ave Maria com Júlio Louzada. Pacificavam-se as almas. Reconfortava-se o espírito ao anoitecer de mais um dia de cão – porque, não se iludam, senhores: sempre assim eles foram e para sempre assim o serão, abaixe o dólar ou não.
A oração de Louzada buscava minorar o sofrimento do dia, e nisso o Brasil não mudou. O ser humano em 2002 continua atrás de algo que alivie sua dor, renove as esperanças de que amanhã pode ser melhor. Parece que infelizmente há novidades no ar, um inesperado bálsamo de hipocrisia e mentira nos programas de televisão na mesma santa hora das seis. Ninguém reza mais chamando Deus em socorro. As emissoras agora colocam no ar as imagens e as personagens mais trágicas de seu repertório de infelicidades. Pode parecer estranho mas funciona assim: você vê o rosto de uma criança estraçalhada por um rot-weiller, como mostrou o “Brasil urgente”, da Bandeirantes, e suspira agradecido. Obrigado, Senhor, por não ter sido comigo.
O mundo cão está solto entre as cinco e sete horas da noite nas redes nacionais de televisão, aquela hora em que a noite cai e o Homem, ainda com a memória das noitadas vulneráveis que passou nas cavernas cercadas de animais, sente medo, sente-se frágil e pede proteção. Marcelo Rezende, Marcia Goldsmith, José Datena, João Kleber e, até tu?, Roberto Cabrini, todos com os olhos esbugalhados como se recebessem novamente a visita daqueles monstros pré-históricos de seus ancestrais, apavoram os crentes do terceiro milênio com a imagem do velhinho (quinta-feira, 10 de outubro) que teve o nariz quebrado por um soco do filho do Maguilla. Os novos profetas do Apocalipse falam aos gritos, alguns lançando o recurso bárbaro de espargir perdigotos sobre a lente da câmera e sublinhar o terror que alivia. Em casa todos agradecemos o nariz que permanece inteiro. Salvos. Pelo menos por mais um dia.
Eu vi Marcia Goldsmith levar mãe e filha ao palco para que a primeira confessasse que, depois de ser tão desprezada pelo ex-marido, o pai da moça, tinha virado lésbica e que aquele senhor que costumava ir ao apartamento das duas, no Bexiga, não era senhor, era senhora, era a sua atual namorada. Eu vi Marcelo Rezende apresentar um homem que estava vendendo um rim para quem lhe doasse um computador e mais os R$ 3 mil que precisava para saldar dívida que contraíra com um agiota para realizar o sonho de publicar um livro. Eu vi Cabrini entrevistando as garotas de programa que diziam estar com o jogador Guilherme, todo mundo mamando uísque, quando o carro que ele dirigia entrou na contramão e bateu em outro. Eu vi Datena dizendo "oh meu Deus, tem fratura exposta" e mandando o helicóptero Águia Dourada se aproximar mais do acidente em que um carro atropelou mãe e filha na Freguesia do Ó.
A vida é um inferno, como dizia o subtexto das orações de Júlio Louzada, e por esse vale de chamas continua marchando a humanidade, agora como se fôssemos todos personagens de um interminável tablóide inglês. E o sexo, então?! Só desgraça. Eu vi dois sujeitos se acusando de "corno" e cada um garantindo que havia desfrutado da mulher do outro, sendo que essas senhoras também estavam presentes, todos aos palavrões e tentando se esmurrar, no palco do circo dos horrores do João Kleber na Rede TV! A idéia é rir da miséria alheia e criar a sensação de que somos superiores ou pelo menos de outra cepa. "O senhor não é mole não, hein?!", gargalhava Marcia Goldsmith diante de um certo senhor Vavá, pai do DJ Thaide e de mais de uma dezena de filhos, "soltos por aí", uma delas sendo apresentada a ele e ao irmão naquele exato momento.
A grande tragédia da família brasileira está sendo exposta, como a fratura do Datena, no mesmo horário em que ela antes se reunia para rezar a Ave Maria e tentar a salvação. A sensação geral, dos dois lados do vídeo, é de que ficou difícil escapar. Os programas dão alívio imediato de que aquela mulher com o cartaz de "mãe desesperada com fome" na Paulista não tem nada a ver com a gente. Mas, pela gritaria que vem do estúdio, pelo deboche sensacionalista, a impressão é de que amanhã esses falsos compungidos te filmam e esculacham. "Olha como ficou o rosto do pobrezinho", dizia Cabrini narrando a imagem do menino estraçalhado pelo cachorro – uma cena que, para piorar as coisas, tinha o selo televisivo de 'Vivo' na testa do 'pobrezinho'.
É o mesmo truque dos programas evangélicos. Estes não mostram a mulher jogada na rua com dez filhos por falta de aluguel, como fez a Goldsmith na quinta-feira. Mas prendem os fiéis pela descrição de um mundo cercado de demos tais e inexplicáveis que só pagando o dízimo ou louvando o pastor da semana conseguiremos sobreviver. Cabrini, Rezende, Marcia, Kleber e Datena reúnem-se todos os dias às seis para avisar que o mundo está acabando, esmurrado pelo Maguilla ou de fome, mas por enquanto você foi poupado. Não oferecem nenhum solução para que se escape do exterminador inevitável. Pelo contrário. Querem mais é salpicar um 'vivo' na testa do próximo morto. Passam, sempre lamentando, a angústia de que ele infelizmente pode ser você.
É verdade que nas orações do Julio Louzada pedia-se que alguém descesse dos céus e salvasse a todos desse inferno – e ninguém, a não ser aquela confusão lá em Fátima, foi visto descendo. Nos programas populares das seis, o deboche ri tanto dos miseráveis e infelizes que não se contém. O helicóptero que sobrevoa mãe e filho atropelados na Freguesia do Ó não traz socorro. Nenhuma salvação vem a bordo do Águia Dourada. É apenas o olho do novo deus-máquina acertando o foco na tua fratura exposta.
Kravnoth, um homem na horizontal - Morto em 03 de Maio de 2002. Indicado por Débora Aline.
Epitáfio
"Eu criei um blog que REALMENTE falava de sexo, quem teve a oportunidade ler, sabe disso. Ninguém se expôs tanto como fiz, meus erros e acertos, mesmo permanecendo anônimo. Além de minhas fantasias eu citava passagens quase q diárias sobre meu relacionamento com *S*, minha namorada.
Mas um dia eu traí o anonimato. E com isso *S* descobriu, e leu meu blog. Me reconheceu, claro, pois ela conhece como ninguém minha escrita, meu jeito, e etc.
Agora, meus amigos blogueiros, pensem na situação: Se você amasse uma pessoa, e descobrisse que ela tem um blog como o meu, citando situações e pessoas e desejos tão abertamente? Você não sentiria ciúmes? Eu sentiria...
Nenhuma dúvida passaria por sua cabeça? Duvido.
Pense em como seria vc descobrir que sua(seu) namorada(o) tem um blog desses? Com todos aqueles comentários picantes? Você aceitaria? O que pensaria? Você gostaria???
Bem, ela não gostou. Nem eu gostaria, confesso. Por isso o blog acaba. É melhor assim. Eu não teria como continuar, até pq ele não seria NUNCA MAIS tão espontâneo como um dia foi." ( , proprietário do Blog Kravanoth em 03/05/2002)
Causa mortis: Uma interpretação da Blogs Mortos
Ele possuia um blog onde contava em detalhes todas suas transas com sua namorada. Um belo dia ela descobriu. Segundo ele, esse foi o motivo da morte de seu blog, porém, surge a dúvida, será que ele não sofreu um processo ?
As vezes tenho o estranho hábito de querer ser humano. Rir, sofrer, chorar, sentir, ter prazer, sentir dor. Estar presente, se fazer ausente, ter vontade de gritar ou forçar um silêncio desnecessário. Ir pelo caminho mais dificil pelo prazer do desafio, correr, senitr o vento nos cabelos, parar simplesmente por não ter razão para isso.
Seria tão mais fácil não ser, não sentir, não estar, simplesmente passar pela vida incógnito, sem se fazer presente na vida de ninguém, nem na nossa própria vida. Não ser ouvido, não ser visto, não ouvir, não sentir...
Não é possível. Esse hábito de querer ser humano me domina, mas não importa. Faz parte do maravilhoso erro que é querer viver.